
Luiz Caldas (ao centro e à frente) já não canta a música ‘Fricote’, mas o sucesso de 1985 inspirou a escolha do Dia Nacional da Axé Music
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♫ OPINIÃO
♩ Por ser legítima expressão musical criada pelo povo preto da Bahia, estado mais negro do Brasil, a axé music merecia mesmo ganhar um dia para ser celebrada em todo o território nacional. Na quarta-feira, 6 de agosto, o presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva oficializou a criação do Dia Nacional da Axé Music, sancionando projeto de lei aprovado pela Câmara dos Deputados em fevereiro e referendado pelo Senado em 2 de julho.
Foi um gesto político justo. Até porque há muito o Brasil, e não somente a Bahia, sempre foi atrás do trio elétrico e do som dessa sigla que nunca simbolizou um gênero em si por abarcar diversos ritmos brasileiros (como o ijexá, o frevo e o galope) e de países vizinhos da América Latina em caldeirão fervente embasado pelo baticum do samba-reggae e por outras levada loucas. Sem falar em astros internacionais como Michael Jackson (1958 – 2009) e Paul Simon, ambos seduzidos pela batida do bloco Olodum.
Só que resultou infeliz a escolha de 17 de fevereiro para a celebração da axé music. É que a data foi escolhida em alusão ao fato de a música Fricote (Luiz Caldas e Paulinho Camafaeu) ter sido lançada em 17 de fevereiro de 1985 no Carnaval de Salvador (BA), detonando a explosão de um movimento que logo ultrapassou as fronteiras da Bahia. E é aí que está o x do problema.
Primeiro sucesso de Luiz Caldas, Fricote foi mesmo o marco zero da axé music. No entanto, a música já foi banida do repertório de Caldas e, ao que consta, de todo o universo da axé music pelo teor racista de versos de uma letra que, além do racismo, ainda sugere violência sexual contra a mulher. O canto da música se tornou inaceitável nos últimos anos com a reflexão sobre o real sentido da letra.
Por isso a pergunta que não quer calar: o Dia Nacional da Axé Music não poderia ser outro? Tinha que ser mesmo 17 de fevereiro? Qualquer data dentro do período carnavalesco faria sentido e jus ao espírito folião da axé music.
O que não faz sentido é exaltar o valor de uma música já limada do território do axé. Ainda que seja impossível apagar o pioneirismo de Fricote na história do movimento irrompido há 40 anos, qualquer outro dia de fevereiro ou mesmo março faria mais justiça à luta do povo que, afinal, criou a axé music para a alegria da Bahia e do Brasil.