STF decide que indícios de violência doméstica impedem volta imediata de crianças ao exterior

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (27) que o retorno de crianças ao exterior, quando trazidas ilegalmente ao Brasil, não deve ser imediato se houver indícios objetivos e concretos de que há violência doméstica na família.
Os ministros fixaram uma interpretação para o acordo internacional assinado pelo Brasil que trata das medidas contra o sequestro internacional de crianças. Esta ação ocorre quando o pai ou a mãe leva o filho menor para outro país sem a autorização do outro responsável. Ou, mesmo quando a autorização existe, não devolve a criança ou adolescente no tempo combinado – por exemplo, leva para férias e não traz de volta.
Convenção da Haia
Os ministros analisam duas ações que questionam as regras para a cooperação nestes casos – a Convenção da Haia de 1980 sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças.
O texto trata, entre outros pontos, de regulamentar o retorno de crianças e adolescentes nesta condição ao seu país de origem. Também define como as autoridades devem agir em cooperação para que o procedimento seja realizado – com a possibilidade, inclusive, de medidas de urgência.
Ação do antigo DEM
Uma das ações foi apresentada pelo antigo DEM. Para o partido, o texto da Convenção tem falhas que acabam por abrir espaço a interpretações que violam a Constituição Federal. Uma delas seria em relação à previsão de retorno imediato das crianças e adolescentes para os locais de onde vieram. De acordo com a sigla, o envio dos jovens nestas condições não pode ser “automático” – só deve se dar quando for medida necessária para proteger o menor. Para isso, as circunstâncias específicas de cada caso devem ser avaliadas.
“O grande problema é que se tem observado, no Brasil, uma absoluta inversão de valores no que se refere à aplicação da Convenção da Haia pelas autoridades administrativas e judiciais. Ao invés de buscar o melhor interesse do menor no caso concreto, dando efetividade aos princípios e direitos constitucionais basilares do nosso sistema jurídico (como a dignidade da pessoa humana, a proteção integral da criança e o devido processo legal), tais autoridades têm simplesmente defendido e determinado o retorno automático da criança ao país requerido, em qualquer caso e a todo custo”, pontuou a legenda.
“Assim, por exemplo, tem-se entendido que, por força da Convenção, a ordem de retorno da criança a seu país de origem poderia se operar de forma automática, sem qualquer investigação prévia acerca das condições do menor e das circunstâncias de sua transferência”, concluiu.
Ação do PSOL
Já a ação do PSOL considera que é necessário interpretar a Convenção seguindo o que prevê a Constituição.
Para o partido, o Brasil deve impedir o retorno da criança mesmo em situações de violência doméstica em que ela não é a vítima direta – ou seja, quando o alvo dos ataques é um dos pais.
A ideia é evitar que o contexto familiar exponha, mesmo que indiretamente, os jovens a perigos de ordem física ou psíquica.
“A melhor alternativa a ser adotada, a fim de garantir a proteção da criança, é impedir o seu retorno ao lar que lhe submeta a uma situação intolerável, mesmo quando seus pais forem as vítimas diretas da violência física e/ou psicológica”, declarou o partido.
Julgamento
Os ministros acompanharam o entendimento do relator, o presidente Luís Roberto Barroso, no sentido de que é preciso estabelecer que, antes do envio da criança ao exterior, deve ser realizado um procedimento que garanta aos pais o contraditório e a ampla defesa. Assim, a ideia é evitar uma execução automática da medida, com a retirada repentina de crianças da família.
Na sequência, eles trabalharam em conjunto na elaboração da tese que resumiu o entendimento, a ser aplicado em casos semelhantes pelo país.
Além disso, também recomendaram providências. Entre elas:
determinar ao Conselho Nacional de Justiça a criação de um grupo de trabalho para elaborar, em 60 dias, resolução para maior celeridade e eficiência na tramitação de processo de restituição de crianças e adolescentes. A decisão final sobre o retorno dos jovens deve ser tomada em até um ano.
devem ser tomadas medidas estruturais e administrativas pelo Poder Executivo para fortalecer a autoridade central que atua nestes casos – a Advocacia-Geral da União.
deve ser elaborado um protocolo de atendimento a mulheres e crianças a serem adotados nas unidades consulares no exterior.
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