Pesquisa com cannabis no Brasil esbarra em burocracia e falta de insumos, apontam universidades


Especialistas pedem à Anvisa que crie marco regulatório para desburocratizar pesquisas com cannabis
Marcelo Brandt/g1
A pesquisa com cannabis no Brasil avança em todas as regiões do país, mas encontra obstáculos que vão da burocracia à dependência de insumos importados. É o que aponta uma nota técnica enviada na quinta-feira (14) ao Ministério da Saúde e à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), formulada por 132 pesquisadores e assinada por 31 universidades e centros de pesquisa, entre eles a Unicamp [confira abaixo a lista completa].
Segundo o documento, a falta de clareza regulatória e a morosidade dos processos de autorização travam o desenvolvimento científico e tecnológico, mantendo o Brasil dependente de tecnologias importadas em um cenário de crescimento global.
Os especialistas também defendem um marco regulatório unificado entre Anvisa, Ministério da Saúde, MAPA e Polícia Federal.
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Nesta reportagem você vai ler ⬇️
Autorizações lentas e burocráticas
Falta de insumos e restrições ao cultivo
Limite de THC e barreiras ao transporte de amostras
Pesquisas veterinárias paradas
Brasil em desvantagem global
Potencial estratégico
⏳ Autorizações lentas e burocráticas
O principal entrave destacado pelo grupo de trabalho é a dificuldade de conseguir autorizações de pesquisa junto à Anvisa. Os pesquisadores relatam prazos indefinidos, avaliações subjetivas e exigências diferentes entre órgãos como Ministério da Agricultura, Polícia Federal e Ministério da Saúde, o que gera insegurança jurídica.
As licenças concedidas também têm validade de apenas dois anos — período considerado incompatível com projetos científicos de médio e longo prazo, que costumam se estender de três a cinco anos.
🌱 Falta de insumos e restrições ao cultivo
Outro ponto crítico é a dependência da importação de insumos como sementes, extratos e padrões de referência. A demora e a dificuldade de acesso a esses materiais elevam custos e comprometem a reprodutibilidade dos estudos.
Além disso, as universidades e centros de pesquisa não têm autonomia para cultivar cannabis em território nacional. Isso inviabiliza testes comparativos e impede a produção de amostras padronizadas em condições ambientais diversas. Para os especialistas, o Brasil precisa permitir o cultivo científico, com regras claras e fiscalização adequada.
🚛 Limite de THC e barreiras ao transporte de amostras
As atuais normas também dificultam pesquisas com substâncias que possuem mais de 0,3% de THC, o principal composto psicoativo da cannabis. Essa restrição impede estudos clínicos mais amplos e comparações que poderiam comprovar benefícios terapêuticos em relação a outros medicamentos, como opioides.
Outro problema é a impossibilidade de transportar sementes, extratos e derivados entre instituições de pesquisa em diferentes estados. Essa limitação dificulta trabalhos colaborativos, validação cruzada de resultados e uso de laboratórios especializados distribuídos pelo país.
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🐄 Pesquisas veterinárias paradas
No campo veterinário, não existem normas específicas para pesquisas em animais de produção, como bovinos, aves e peixes. Segundo os pesquisadores, essa lacuna impede a geração de dados sobre dosagens seguras e potenciais benefícios da cannabis na agropecuária.
A nota técnica também aponta a ausência de protocolos para o uso de coprodutos da cannabis, como resíduos do cultivo e da extração, que poderiam ser transformados em insumos agrícolas, biomateriais ou cosméticos.
↘ Brasil em desvantagem global
Enquanto enfrenta impasses internos, o Brasil assiste a outros países avançarem na liderança mundial do setor. Segundo dados da Embrapa citados no documento, Estados Unidos, China e Canadá registraram mais de 1,1 mil patentes relacionadas à cannabis nos últimos cinco anos.
Para os pesquisadores, superar a burocracia é fundamental para transformar o potencial acadêmico brasileiro em inovação. Eles defendem um marco regulatório unificado entre Anvisa, Ministério da Saúde, MAPA e Polícia Federal, com prazos definidos para análises e autorizações institucionais de longo prazo.
✈ Potencial estratégico
A nota técnica conclui que um ambiente regulatório claro permitiria ao Brasil sair da posição de importador e se tornar exportador de tecnologias ligadas à cannabis.
Veja a nota na íntegra
Isso fortaleceria a soberania tecnológica, geraria inovação em áreas como saúde e agricultura e atrairia investimentos privados em pesquisa e desenvolvimento.

Confira a lista das entidades que assinaram o documento:

1. Embrapa
2. Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)
3. Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
4. Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)
5. Universidade Federal do ABC (UFABC)
6.Universidade Estadual Paulista (UNESP)
7. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ)
8. Universidade de Juiz de Fora (UFJF)
9. Universidade de Lavras (UFLA)
10. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
11. Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ)
12U niversidade Federal de Viçosa (UFV)
13. Universidade Presbiteriana Mackenzie
14. Universidade de Brasília (UnB)
15. Universidade Federal de Goiás (UFG)
16. Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)
17. Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS)
18. Universidade Federal da Bahia (UFBA)
19. Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
20. Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
21. Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
22. Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF)
23. Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE)
24. Universidade Federal do Piauí (UFPI)
25. Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
26. Universidade Federal do Amapá (UNIFAP)
27. Universidade Federal de Rondônia (UNIR)
28. Universidade Estadual de Londrina (UEL)
30. Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)
31. Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
32. Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
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