
3 de fevereiro – Moradores do Jardim Pantanal, na Zona Leste de São Paulo, enfrentam terceiro dia seguido de inundações no bairro, que sofre há décadas com os problemas das enchentes. A região com cerca de nove bairros fica numa área de várzea do rio Tietê
Fábio Vieira/FotoRua via Estadão Conteúdo
O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu nesta quarta-feira (6) que a Câmara Municipal da capital deve instalar duas CPIs que haviam sido aprovadas, mas nunca foram instaladas por falta de indicação de membros: a CPI das Enchentes no Jardim Pantanal e a CPI das Fraudes na construção de imóveis de interesse social (HIS). A decisão atende a dois mandados de segurança apresentados por vereadores do PT.
A bancada petista celebrou a decisão do TJ-SP e informou que exige o cumprimento imediato das decisões judiciais (veja nota completa abaixo).
Por unanimidade, os 25 desembargadores do Órgão Especial entenderam que a presidência da Câmara poderia ter garantido a criação das comissões mesmo sem todos os nomes indicados pelos partidos.
Isso porque já existem precedentes: foi assim que duas CPIs que estão em andamento, a dos Pancadões e da Leitura das Íris, foram instaladas, com indicações feitas diretamente pela presidência da Casa.
Agora, com a decisão da Justiça, o presidente da Câmara terá que nomear os vereadores da base do governo que não foram indicados pelos partidos aliados do prefeito Ricardo Nunes (MDB), o que impedia a instalação das comissões.
As duas CPIs em questão foram aprovadas ainda no início do ano, mas perderam validade porque a base do prefeito não indicou os nomes que faltavam.
Segundo o Tribunal, o regimento da Câmara deixa claro que, uma vez aprovadas em plenário, as CPIs devem ser instaladas. Além disso, os desembargadores reforçaram que esse tipo de comissão é um instrumento da minoria — e que a maioria não pode usar sua força política para impedir investigações.
O g1 entrou em contato com a Câmara de SP, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.
O que diz a bancada do PT
“A Bancada do Partido dos Trabalhadores (PT) na Câmara Municipal de São Paulo obteve vitória histórica no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que reconheceu o direito líquido e certo das minorias parlamentares à instauração de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), determinando a imediata instalação de duas CPIs que haviam sido aprovadas, mas obstruídas pela Presidência da Casa Legislativa.
As decisões foram proferidas nos Mandados de Segurança Cíveis nº 2116940-43.2025.8.26.0000, de relatoria do Desembargador Gastão Toledo de Campos Mello Filho, e nº 2116781-03.2025.8.26.0000, de relatoria do Desembargador Wallace Paiva Martins Junior. Ambos os julgados reconhecem que o Presidente da Câmara incorreu em ilegalidade e abuso de poder ao não instalar as CPIs da Habitação Popular e das Enchentes no Jardim Pantanal, respectivamente, mesmo após sua aprovação formal e preenchimento dos requisitos constitucionais e regimentais.
As CPIs foram propostas e lideradas pela vereadora Luna Zarattini Brandão, líder da Bancada do PT, com apoio de outros parlamentares comprometidos com o direito à moradia e com a apuração das responsabilidades pela tragédia socioambiental no Pantanal Paulistano.
No caso da CPI das Habitações de Interesse Social e de Mercado Popular, o Tribunal reconheceu que a omissão do Presidente em proceder à instalação, mesmo após aprovação em 2 de abril de 2025 e expiração do prazo regimental de 15 dias, violou o art. 58, §3º da Constituição Federal, que garante às minorias parlamentares o direito subjetivo à criação de CPIs.
No caso da CPI das Enchentes no Jardim Pantanal, a decisão afirma que não cabe à Presidência ou às lideranças partidárias impedir ou protelar a instalação de uma CPI, sob pena de se transformar o Regimento Interno em instrumento de bloqueio de direitos fundamentais. O TJSP repudiou a tentativa de esvaziamento do direito da minoria pela omissão deliberada e reafirmou que, diante da inércia dos líderes, cabe ao Presidente designar diretamente os membros da comissão.
Ambas as decisões fazem referência expressa à jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal, especialmente ao Tema 1.120 da Repercussão Geral, segundo o qual a criação de CPI, quando atendidos os requisitos constitucionais (1/3 das assinaturas, fato determinado e prazo certo), é ato vinculado e obrigatório, sendo insuscetível de juízo discricionário quanto à conveniência ou oportunidade.
Para a vereadora Luna Zarattini, trata-se de um marco na defesa da democracia e da fiscalização legislativa:
“A Justiça reconheceu que não se pode calar a voz da minoria. A Câmara é do povo, e o povo quer respostas. Vamos investigar os contratos habitacionais e as responsabilidades pelas enchentes no Jardim Pantanal. Não descansaremos até que as CPIs estejam funcionando e os fatos apurados.”
A Bancada do PT exige o cumprimento imediato das decisões judiciais, com a instalação formal das CPIs, a designação dos membros e o início dos trabalhos investigativos. Trata-se de uma vitória da legalidade, da transparência e da função fiscalizatória do Poder Legislativo, em defesa dos direitos da população mais vulnerável da cidade.”
CPIs
Valor citado por Nunes para remover famílias do Jardim Pantanal é menor que o estipulado em estudo da Prefeitura
A CPI sobre as Habitações de Interesse Social (HIS) foi proposta pelo vereador Rubinho Nunes (União Brasil) e vai apurar irregularidades de construtoras na cidade de São Paulo na destinação de imóveis para famílias de baixa renda, vendidos para grupos com renda superior ao limite permitido por lei.
A irregularidade já rendeu multas de mais de R$ 31 milhões a duas construtoras flagradas em irregularidades semelhantes.
Elas recebiam isenção fiscal da prefeitura para construir imóveis para famílias que ganham até três salários-mínimos, mas a venda dos apartamentos era feita para pessoas com alto valor aquisitivo.
Segundo Rubinho Nunes, o objetivo do grupo será “apurar com seriedade todas as denúncias envolvendo os programas de habitação popular”.
“Queremos compreender como os benefícios estão sendo utilizados e assegurar que cheguem, de fato, a quem mais precisa. É de interesse da cidade de São Paulo que as habitações sejam garantidas”, afirmou.
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Já a segunda CPI, de autoria do vereador Alessandro Guedes (PT), irá verificar a atuação do poder público na prevenção e mitigação dos impactos ambientais e sociais que afetam os moradores do Jardim Pantanal.
Conforme o g1 mostrou, no início de fevereiro o bairro ficou uma semana embaixo dágua, em razão das fortes chuvas que caíram na cidade. A comunidade erguida na região de várzea do Rio Tietê sofre desde os anos 80 com os constantes alagamentos.
Na época da crise mais recente, a gestão Ricardo Nunes (MDB) chegou a apresentar um estudo preliminar da Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras (Siurb) que apontou que o custo de remoção das famílias e acomodação em habitações de interesse popular é de até R$ 1,9 bilhão para a gestão municipal.
O valor é superior ao que a Siurb calcula para a realização de obras de enfrentamento da enchente no bairro, calculadas entre R$ 1 bilhão e R$ 1,3 bilhão.
O prefeito de São Paulo também chegou a afirmar em fevereiro que estudava a possibilidade de oferecer um auxílio entre R$ 20 mil e R$ 50 mil para que os moradores do Jardim Pantanal deixassem as áreas mais castigadadas pelas enchentes.
A Vila Seabra, no Jardim Helena, zona leste de São Paulo, enfrenta o terceiro dia de ruas alagadas, nesta segunda- feira (3), após as fortes chuvas que atingiram a região nos últimos dias.
EDI SOUSA/ATO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO