
Alunos em sala de aula (ILUSTRATIVA)
Davi Ribeiro/ Arquivo/ Jornal A Tribuna
Um estudo divulgado pela Rede Escola Pública e Universidade (Repu), entidade que reúne professores e pesquisadores de universidades públicas do estado de São Paulo, revelou que Minas Gerais e outras cinco unidades da federação não cumprem a carga horária mínima obrigatória da Formação Geral Básica (FGB) no ensino médio.
A análise, baseada em matrizes curriculares de 27 redes estaduais, mostra que, mesmo após a reforma educacional de 2024, há estados brasileiros que não se adequaram à exigência legal de 2.400 horas mínimas para essa etapa da educação.
No caso de Minas Gerais, o fator que mais pesou para o descumprimento do novo modelo educacional foi a liberação antecipada de estudantes, comprometendo a jornada escolar.
A reportagem procurou a Secretaria Estadual de Educação, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Segundo o levantamento da Repu, os estados que não se adequaram ao novo currículo escolar apresentaram diferentes formas de descumprimento, como:
redução do tempo das aulas (por exemplo, aulas de 45 minutos em vez de 50 ou 60);
adoção de aulas a distância em desacordo com a legislação;
inclusão de atividades extraescolares como parte da carga horária letiva.
A nova legislação, sancionada em julho de 2024, determinou a recomposição da carga horária da FGB, a formação geral básica, que havia sido reduzida para 1.800 horas pela reforma de 2017. A medida visava garantir o acesso dos estudantes a uma formação básica mais sólida e equitativa. No entanto, segundo a REPU, a recomposição não foi efetivada em diversos estados.
Estados que mais descumprem
Os estados que mais descumprem as atuais normas de carga horária mínima do currículo educacional nacional são, segundo o estudo:
Amazonas – até 25% abaixo do mínimo legal.
Rondônia – até 20% abaixo (em parte por uso de EaD).
Bahia – cerca de 16,7% abaixo.
Pará – cerca de 16,7% abaixo.
Santa Catarina – cerca de 6,3% abaixo.
Minas Gerais – descumprimento parcial, afetando os Itinerários Formativos, não a FGB diretamente.
Impactos para os estudantes
Ao g1, o professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) Fernando Cássio, um dos integrantes do grupo que elaborou o estudo, explicou que MG apresentou um fenômeno característico do estado, em que grande parte dos estudantes acaba abrindo mão de parte da carga horária escolar diária para trabalhar.
“Por exemplo, se o aluno tem seis aulas diárias, ele assiste a cinco diariamente porque sai mais cedo da escola para trabalhar. Isso, ao longo dos três anos do ensino médio, representa uma perda de seis meses de aula. É como se, para esses alunos, o ensino durasse dois anos e meio, e não os três anos previstos pelo Ministério da Educação”, afirmou o professor.
De acordo com a nota técnica, a redução da carga horária compromete o acesso dos estudantes ao conhecimento, afeta a alocação de professores e pode gerar distorções nos repasses do Fundeb.
Além disso, o estudo aponta que a recomposição da FGB feita pelas redes estaduais em 2025 frequentemente não se traduz em mais tempo real de aula. Em média, a carga horária da FGB após as duas reformas sofreu uma redução líquida de 13,7%.
Estímulo ao trabalho e evasão escolar
Ainda segundo o professor Fernando Cássio, a ausência de alunos na escola aumenta ainda mais as dificuldades de acesso à educação. Na teoria, o Novo ensino médio prevê a possibilidade de que estudantes que trabalham possam integrar suas atividades laborais à carga horária escolar, mas somente em situações específicas e com regras claras.
A nota técnica da REPU alerta que, embora a lei restrinja essa possibilidade apenas ao ensino médio em tempo integral, Minas Gerais aplica essa flexibilização também no tempo parcial.
Isso, segundo o estudo, pode reduzir a jornada escolar real, estimular o trabalho precoce e desprotegido de adolescentes, dificultar o controle da frequência escolar e comprometer a qualidade da formação dos estudantes.
“Percebemos nessa pesquisa que há uma política em Minas Gerais que incentiva esses alunos a trabalharem, e tudo bem os adolescentes terem uma fonte de renda, mas há um grande problema na evasão escolar”, complementou.
Desequilíbrio na carga horário entre disciplinas
A análise também revela desequilíbrios na distribuição das cargas horárias entre as disciplinas. Língua Portuguesa e Matemática concentram a maior parte do tempo, enquanto componentes como Artes, Educação Física, Filosofia, Sociologia e Língua Espanhola são frequentemente negligenciados.
A disciplina de Espanhol, por exemplo, foi praticamente suprimida das matrizes curriculares. Antes da reforma de 2017, era ofertada por 70% das redes estaduais. Em 2025, apenas quatro estados mantêm a disciplina na FGB.
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