Subocupação atinge quase 5 milhões de brasileiros, que lidam com imprevisibilidade do mercado e períodos sem trabalho


Subocupação atinge quase 5 milhões de brasileiros
Reprodução/TV Globo
Quase cinco milhões de brasileiros gostariam de trabalhar mais do que trabalham atualmente e estão disponíveis para isso. Muitos são autônomos e convivem com períodos de muito serviço e outros sem nenhuma demanda. Isso torna fundamental o planejamento financeiro.
A Pérola diz que não é modelo, nem vendedora ou apresentadora. Que faz… “provador”.
“Você pega a roupa, veste, igual eu estou usando essa aqui, roupa da loja, e fala sobre ela, sobre o caimento, a cor, a tendência, o tecido”, diz Pérola Couto, criadora de conteúdo digital.
Repórter: Você diz que tem um propósito, que não é só vender. Qual é?
Pérola: É de inspirar mulheres com corpo parecido com o meu.
E em outro ponto desse mercado digital está a Stefany. Em um vídeo, atrasada para uma reunião presencial, resolveu gravar um vídeo pra impulsionar a carreira no digital.
“Vou terminar de me arrumar aqui porque estou super atrasada. E por coincidência o vídeo acabou viralizando. 2 milhões de visualizações”, disse Stefany Lourenço, criadora de conteúdo digital, na gravação.
Repórter: Um produtor de conteúdo trabalha para isso, para viralizar?
Stefany: Exatamente. Só que nem todo mundo consegue trabalhar só com a internet até realmente crescer e criar uma rentabilidade.
Na internet, o Bruno é profissional sênior. Pela lente da câmera viu a profissão ser transformada com o avanço da tecnologia.
“Meu filho fala: ‘quando você vê alguém fotografando com celular deitado, é coisa de tiozão’. Porque ele fala que tem que fotografar sempre no modo retrato já para rede social. Antigamente era uma coisa de difícil acesso e cara, né? E hoje em dia com a facilidade do celular ela está presente na vida de todo mundo. Para minha área que trabalho hoje em dia eu vi um nicho aí para acabar entrando. É o nicho de fotografia gastronômica”, conta Bruno Pires, fotógrafo de comida.
“Embalar” comida paras plataformas digitais foi um jeito de continuar vivendo da fotografia.
“Quando eu faço uma foto de um prato de comida, eu consigo mexer com o desejo das pessoas”.
Só que nem sempre tem trabalho.
“É uma área nova que as pessoas ainda estão se descobrindo também, como fazer o marketing. Então tem mês que a gente trabalha muito. Agora, tem meses que é parado, né? Então é uma loucura”.
A imprevisibilidade parece ser uma das regras do mercado de trabalho digital.
“É sempre um trabalho de formiguinha, sabe? Você vai gravando provador numa loja, vai criando conteúdo para alguma outra marca. Eu acho que dava para trabalhar muito mais”, relata Pérola.
Essa é uma questão importante. A Pérola, a Stefany e o Bruno fazem parte de um grupo de brasileiros que trabalha menos de 40 horas por semana, gostaria de trabalhar mais e está disponível para isso. O IBGE chama de subocupados por insuficiência de horas. Cerca de 5 milhões de pessoas.
Se o IBGE soma essas pessoas ao número de desempregados, a taxa de desemprego sobe bastante. Segundo os economistas, isso é sinal de deterioração do mercado de trabalho.
Pode parecer um paradoxo que, ao mesmo tempo, faltem profissionais para trabalho formal nos caixas de supermercado, na construção civil, para dirigir caminhões… Ao que parece, as pessoas querem fazer outra coisa.
“A gente está falando de uma sociedade cada vez mais exigente e a gente tem mudanças geracionais, é isso que os especialistas mostram, né? Os jovens com anseios diferentes dos grupos mais velhos e que querem ter autonomia, têm outros interesses”, diz Zeina Latif, consultora econômica.
O professor de economia da Fundação Getúlio Vargas estuda o mercado de trabalho há décadas e diz que esses profissionais estão à frente da legislação.
“O principal setor hoje no Brasil de emprego são os serviços. E esse novo mundo digital das novas tecnologias requer flexibilidade, requer maleabilidade. Então essas pessoas estão conectadas com esse novo mundo. Na verdade, estão mais espertas do que nós, os legisladores, querendo regular relações de trabalho que estão cada vez menos existentes no mundo moderno. Que é importante regular relações de trabalho, é importante, mas regular as relações de trabalho do século 21 para garantir relações de trabalho que sejam benéficas para todas as partes, em que as pessoas se sintam autônomas, que se sintam respeitadas e se sintam crescendo profissionalmente nesse tipo de relação”, destaca André Portela, professor titular FGV.
Mas as contas não vão esperar.
Pérola Couto: Tem mês que eu ganho bastante, tem mês que não ganho nada.
Repórter: Fica difícil para se organizar, né? Como é que você faz?
Pérola: Está difícil.
Acontece nas melhores famílias.
“Tem mês que a gente ganha muito. Eu falo que a gente está rico. E tem mês que a gente está pobre”, comenta Bruno Pires, fotógrafo de comida.
Pode ser difícil lidar com uma renda instável e incerta. A dica dos economistas é dividir tudo o que recebe em três potes:
60% para os gastos fixos mensais,
20% para uma reserva de emergência;
e pelo menos 20% para investimentos de longo prazo — aposentadoria, por exemplo.
E isso vale para todo mundo. Esse mundo novo traz desafios e ferramentas também: a popularização do mercado financeiro no Brasil.
“Você criou uma diversidade. Tanto o mercado brasileiro de investimentos amadureceu, quanto também as pessoas estão amadurecendo, que têm que usar esse mercado. E também a tecnologia trouxe tudo isso para próximo da pessoa, né? O que não falta é aplicativo e ferramenta para as pessoas utilizarem para melhorar a sua educação financeira e seus investimentos. O que falta um pouco é a disciplina para usar eles de forma correta”, ressalta Michael Viriato, estrategista de investimentos.
Na teoria a gente entende, mas na prática pode ser bem difícil guardar dinheiro. Segundo os economistas, porque a maior parte das pessoas enxerga isso assim: recebe, consome e, se sobrar, guarda. Só que pode nunca sobrar. A dica é: recebe, guarda um percentual fixo e procura viver com o que sobrar.
E assim, quem sabe, em vez do carro, o Marcos vá dirigir o próprio negócio. De manicure, a Nat vire dona de salão. O Naldo faz tudo, que já fez tanto, vá viver das laranjas que plantou em Maceió. E a Simone será que não embarca para conhecer o Brasil.
“Se você está investindo, se você está guardando, poupando, você vai ter mais no futuro do que você tem hoje. Então você vai poder consumir mais do que você consome hoje. É como se o dinheiro fosse um trabalhador, que está fabricando mais dinheiro para você. E aí, lá no futuro, com o passar do tempo, ele vai fabricando cada vez mais dinheiro pra você”, Michael Viriato, estrategista de investimentos”, diz Michael Virato, estrategista de investimento.
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