Cidade de SP concentra 18,5% de todos os roubos e furtos de celular do Brasil; capital tem a 3ª maior taxa entre os municípios do país


Suspeito é preso pela Polícia de SP com celulares roubados nos blocos de carnaval da cidade neste fim de semana.
Reprodução/Divulgação
A cidade de São Paulo registrou, sozinha, 18,5% de todos os roubos e furtos de celulares ocorridos no Brasil em 2024, mesmo concentrando apenas 5,6% dos habitantes do país. Já o estado contabilizou 31,4% desse tipo de crime. Os dados fazem parte do 19ª Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado nesta quinta-feira (24).
De acordo com o levantamento:
169.556 aparelhos foram subtraídos na capital paulista no último ano;
O equivalente a 19 celulares levados por hora pelos criminosos;
A taxa proporcional foi de 1.425,4 mil ocorrências por 100 mil habitantes,
O número coloca São Paulo como a terceira cidade com a maior taxa do país, atrás apenas de São Luís (1.599,7) e Belém (1.452,2);
Em números absolutos, São Luís registrou 17.406 celulares subtraídos; Belém, 20.310.
Veja os números no gráfico abaixo.
O documento também revela um cenário de industrialização do crime envolvendo celulares, desde a abordagem nas ruas até a exportação clandestina para o exterior (leia mais abaixo).

Crime em escala industrial
O estudo aponta que os roubos e furtos de celular deixaram de ser um ato isolado e passaram a funcionar como parte de uma cadeia organizada, que inclui receptadores, especialistas em desbloqueio, golpistas digitais e até exportadores de aparelhos. Algo em uma escala quase industrial.
Segundo o doutor em Ciência Política Guaracy Mingardi, um dos autores do relatório, essa estrutura funciona como uma linha de produção:
“O criminoso da ponta é o elo mais fraco e visível. Assim que rouba o celular, ele repassa para o receptador e logo parte para outro crime”, apontou o especialista.
Mingardi explica que, após a pandemia de Covid-19, os aparelhos passaram a mediar quase todos os aspectos da vida das pessoas. Isso intensificou o interesse dos criminosos pelos equipamentos, ditando a dinâmica da criminalidade no país, especialmente nos grandes centros urbanos.
“Existem pelo menos dois caminhos conhecidos para os celulares roubados: venda local e no exterior do hardware do equipamento ou desmonte e comercialização de suas peças em lojas e assistências técnicas irregulares”.
O 1º passo é tentar acessar banco e redes sociais da vítima
Logo após o crime, o objetivo é acessar dados da vítima, especialmente informações bancárias, senhas e contas de redes sociais. Se o aparelho estiver desbloqueado ou se o criminoso conseguir alterar a senha, os lucros podem ser imediatos.
Caso contrário, o serviço fica por conta dos especialistas em desbloqueio, geralmente ligados a organizações criminosas, como o Primeiro Comando da Capital (PCC).
Quando o golpe não dá certo, entra o “desmonte” ou a exportação
Se o uso fraudulento do aparelho não for possível, o crime entra em uma segunda etapa: revenda das peças ou envio para o exterior. A desmontagem é feita em oficinas clandestinas e assistências técnicas que operam fora da legalidade, principalmente no Centro de São Paulo.
“Um fenômeno interessante é que as peças dos aparelhos mais novos não têm tanta saída, já que as partes (a tela é a mais vendida) estão disponíveis e, apesar de custarem mais, possuem locais de venda oficiais ou semioficiais. Já para os que não estão mais no mercado, a situação é outra. Segundo lojistas, quando a peça é vendida como similar, tem boa probabilidade de ser legítima; quando ela é original, no entanto, é provável que seja fruto de delito, diz o documento.
Marcas ou modelos não mais comercializados no país não têm estoques legítimos, e as empresas nem se interessam por repô-los. Portanto, quem compra uma peça dessa stem grande chance de lidar com mercadoria ilícita.
A exportação e os ‘ninhos’
Celulares mais novos e de marcas populares são enviados inteiros para fora do Brasil, especialmente para países da África e da Ásia. O principal destino citado é o Senegal, mas também há registros de envios para Nigéria, Gana, Índia e China, onde o controle do IMEI (código de identificação dos aparelhos) é falho ou inexistente.
A Rua Guaianases, na região da Cracolândia, é apontada como um dos principais centros de atuação dos receptadores que compram celulares para exportação. A maioria dos presos nessas operações é de origem senegalesa, e muitos deles vivem em cortiços, o que dificulta o trabalho da polícia.
O combate ao ninho de celulares roubados nessa região é considerado um desafio para o estado. O local é formado por um labirinto de hotéis, apartamentos e lojas, num emaranhado que dificulta ainda mais o trabalho das autoridades.
Moradores e comerciantes da região afirmam que alguns receptadores voltam a atuar dias após serem presos e que há um criminoso conhecido como “Sheik”, citado como chefe de um desses grupos, inclusive um ainda na África, que seria o chefão do esquema.
O modelo de atuação dos criminosos segue os seguintes passos:
Eles compram dos ladrões por uma fração do preço de fábrica (normalmente entre 10% e 15%), negociam com outras quadrilhas especializadas na invasão e uso para golpes e guardam o aparelho até acertarem com os “importadores”;
A mercadoria segue para o exterior de duas formas distintas: dentro de equipamentos eletrônicos em contêineres, ou via aérea, em remessas de dezenas de peças, normalmente enviadas como cargas não acompanhadas;
O destino desses carregamentos varia bastante, mas quase todos são enviados para a África e Ásia;
Em países como Senegal, Nigéria,Gana, Índia e China, é comum que não haja fiscalização e checagem do IMEI, de modo que os equipamentos roubados em outros países acabando sendo habilitados.
Raio-x dos roubos e furtos de celular no Brasil
Em relação aos roubos e furtos:
A maioria das vítimas são homens (59,1%) e pessoas em geral entre 20 e 39 anos e negras (63%), que são atacadas em vias públicas (79,6%) em horários de pico — das 6h ás 8h e das 19h às 20h.
Já em relação ao crime de furto de forma isolada:
50,2% das vítimas são mulheres;
O crime ocorre com mais frequência aos sábados e domingos (34%);
Muitas vezes em estabelecimentos comerciais (14,6%);
54,4% das vítimas são negras.
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