ChatGPT modo educação: IA adota método socrático e tenta virar ferramenta de estudo; veja avaliação


ChatGPT disponibiliza método socrático de estudos
Montagem de IA/ChatGPT
Amanhã é dia de prova de matemática. Você precisa saber tudo sobre trigonometria. Em vez de perguntar ao ChatGPT “como calcular o cosseno”, prefere digitar:
👩‍💻:“Por favor, acione o método socrático de estudo”.
➡️A dinâmica do diálogo automaticamente fica invertida, e é a ferramenta que faz uma série de questões a você. Será que essa técnica realmente é útil? Funciona? Quais seus pontos fracos e fortes? O g1 testou, com a ajuda de sete professores, e fez uma análise mais abaixo, nesta reportagem.
De cara, o robozinho já avisa:
🤖: “Claro! Em vez de simplesmente te entregar respostas prontas, eu vou te fazer perguntas guiadas que te ajudem a pensar criticamente, investigar a fundo e chegar às conclusões por conta própria”.
E começa a conversa:
🤖Chat: O que você entende por cosseno?
👩‍💻Aluno: Não faço a menor ideia do que seja.
🤖Chat: Perfeito — a melhor resposta para começar o método socrático é justamente essa: “não sei”. Porque agora podemos construir o entendimento do zero, com base em perguntas guiadas. Vamos lá: Você já ouviu falar em triângulo retângulo?
👩‍💻Aluno: Sim, com ângulo reto.
🤖Chat: Em um triângulo retângulo, você sabe como chamamos os lados?
E, assim, o papo vai se desenrolando. Abaixo, descubra:
Por que “modo socrático”?
Em que casos essa ferramenta é mais útil? E quando pode atrapalhar?
Qual tipo de aluno tem mais a ganhar com o método?
Que tipo de pergunta o ChatGPT faz?
O sistema gera boas imagens?
Quais as principais vantagens?
E os pontos fracos?
Por que “modo socrático”?
Criado pelo filósofo grego Sócrates (470 a.C. – 399 a.C.), o método socrático é uma forma de diálogo que estimula o participante a examinar criticamente suas próprias ideias. Em vez de oferecer respostas prontas, o questionador conduz a conversa com perguntas sucessivas, levando o outro a identificar possíveis falhas em seu raciocínio e a buscar uma compreensão mais profunda do tema.
O processo costuma ser dividido em dois momentos:
Ironia – fase em que se expõem incoerências ou contradições no pensamento do interlocutor.
Maiêutica – etapa em que ele é guiado a um “parto das ideias”, elaborando novos conceitos a partir de sua própria reflexão.
Mais do que um exercício intelectual, essa técnica valoriza o diálogo, o autoconhecimento e a análise crítica como instrumentos de aprendizagem. Ao longo dos séculos, consolidou-se como uma das bases do pensamento crítico e da filosofia ocidental.
Ricardo Salgado Gonçalves, coordenador de Filosofia e Sociologia do Colégio Bandeirantes (SP), faz uma ressalva à nomenclatura de “método socrático” da inteligência artificial.
“Sócrates se colocava na posição de estéril em ‘Só sei que nada sei’, ou seja, tinha consciência da sua ignorância. É algo que se opõe ao Chat GPT, que ‘sabe de tudo’ e, com isso, ensina”, diz.
Em que casos essa ferramenta é mais útil? E quando pode atrapalhar?
O método é mais eficiente para revisar conteúdo e organizar ideias do que para aprender um tema pela primeira vez.
O professor Idelfranio Moreira, gerente executivo de Inovações do SAS, simulou ser um aluno do 2º ano do ensino médio. Veja o depoimento dele após usar a ferramenta de estudo socrático do ChatGPT:
“De início, até funcionou bem. As perguntas de partida foram bem direcionais. O chat sempre dando instruções e incentivo. Entretanto, a certa altura, as coisas complicaram, relatei minha dificuldade e a ajuda que ele forneceu não foi útil, não me ajudou a entender.
Pedi imagens e o output não foi bom. Insisti e ele retornou imagens como as que eu poderia encontrar numa busca no Google.
Acredito que um aluno iniciante pode introduzir-se em alguns assuntos, mas chega um momento em que não dá para progredir. Um aluno avançado deve se beneficiar mais.
Pedi questões do assunto no ENEM. Ele apontou, corretamente, quatro questões. Mas, quando pedi orientação para responder a mais simples, ele comentou e resolveu por mim!”
Para quem busca uma resposta rápida, especialmente na véspera de uma prova, perguntar diretamente à ferramenta pode ser mais produtivo.
A dinâmica de diálogo e de construção de conhecimento leva tempo — isso pode ser um impeditivo para quem busca dinamismo e rapidez, explica Mário Abbondati, coordenador de Tecnologia Educacional do Colégio Bandeirantes.
“O método é eficiente para uma aprendizagem profunda, mas se torna muito longo e exaustivo caso o aluno queira obter uma resposta direta”, diz.
Professor testou a ferramenta do método socrático
Arquivo pessoal
Qual tipo de aluno tem mais a ganhar com o método?
A maior parte dos especialistas consultados afirma que o método beneficia principalmente alunos mais avançados, já que as perguntas do ChatGPT são abertas e exigem um certo conhecimento prévio para que o diálogo avance significativamente. Até é possível responder “não sei” ou “não faço ideia”, mas a disciplina será pouco aprofundada nesses casos.
Nada impede, no entanto, que um aluno mais “cru” seja beneficiado, desde que ele realmente esteja disposto a aprender e disponha de tempo. A ferramenta adapta-se bem à faixa etária e à série informadas pelo estudante.
Que tipo de pergunta o ChatGPT faz?
No modo socrático, a abrangência da pergunta vai depender do grau de domínio que o aluno tem do assunto. Se as respostas demonstrarem um desconhecimento maior da disciplina, as questões “voltarão várias casinhas” na escala de complexidade.
Isso conduz o estudante na elaboração gradual do conteúdo. O objetivo das perguntas é justamente estimular a construção de conhecimento por meio da reflexão e do raciocínio.
O sistema gera boas imagens?
Imagens geradas pelo ChatGPT não foram didáticas
Arquivo pessoal
O uso de imagens nem sempre é adequado. A pessoa pode se deparar com desenhos um tanto incompreensíveis:
Quando o usuário pede para que a IA capriche mais no desenho, ela costuma ficar “desnorteada”.
“As imagens não foram tão boas. De início, pedi para ele gerar um infográfico com as informações, mas ele enviou um arquivo doc. Também solicitei determinadas obras de arte, e ele me deu o nome do quadro, sem imagem e sem um link”, diz Ignícios Beltrão, professor de português do SAS Educação.
“Depois, testei a geração de mapas mentais, mas as informações apresentadas pelo ChatGPT não foram suficientes. Muito confusas, inclusive. Você precisa ficar pedindo para ele atualizar a imagem, colocar mais informações, mas ele se perde na hora de fazer isso.”
Quais as principais vantagens?
É extremamente útil para revisar tópicos já estudados, organizar ideias e identificar possíveis lacunas no conhecimento.
Promove a construção profunda do conhecimento, incentivando a reflexão e a investigação. Isso pode levar a uma aprendizagem mais sólida do que a promovida apenas pela “decoreba”.
Pode ajudar a mostrar questões sobre determinado tema que já caíram no Enem e em outros vestibulares. É um sistema de busca mais rápido do que procurar no Google. Mas é preciso deixar claro que a intenção não é saber a resposta logo de cara.
O tom positivo de incentivo estimula o aluno a melhorar suas respostas e a persistir. O sistema adapta-se à linguagem para engajar o estudante, tornando a interação mais leve e amigável.
Funciona como um excelente guia de estudos e pode ser usado para ajuste fino de conceitos complexos.
As informações geralmente parecem corretas e atualizadas. A única exceção encontrada foi a respeito dos Estados Unidos: o sistema não reconhece Donald Trump como presidente atual do país — informou erroneamente que é Joe Biden. Ao mesmo tempo, explica de maneira certa os motivos e impactos das tarifas comerciais impostas recentemente pelo governo americano e as zonas de conflito entre Rússia e Ucrânia.
“O momento mais apropriado [para usar a ferramenta] me parece ser após o estudo de determinado conteúdo, funcionando como uma revisão. Como o aluno precisará responder a perguntas e não receberá a resposta ‘pronta’, é necessário que tenha uma base prévia para que o diálogo atue como um pequeno teste, permitindo identificar lacunas de aprendizagem”, diz Rodrigo Magalhães, professor da Plataforma AZ.
E os pontos fracos?
Pode ser muito longo e exaustivo para quem busca respostas diretas e rápidas.
“Geralmente, a galera que entra no ChatGPT para fazer uma pergunta quer dinamismo. Mas o aluno precisa saber que o método socrático é uma fonte de estudo não para consulta, e sim para uma construção do saber”, diz Jeferson Petronilho, da Escola SEB Lafaiete.
Existe o risco de haver “trapaça”. A qualquer momento, se o estudante fizer uma pergunta direta, o ChatGPT vai respondê-la de prontidão. Não há um mecanismo de controle.
Como já explicado nesta reportagem, as perguntas abertas exigem um certo nível de conhecimento prévio do aluno, o que pode limitar o benefício para quem tem pouco domínio do tema.
O tom positivo das respostas, embora incentive o estudante, pode, em alguns casos, não deixar claro quando houver uma falha grave por parte do aluno. A ferramenta fica tão concentrada em instigar o usuário que acaba não demonstrando a incorreção tão explicitamente. Essa “generosidade” excessiva pode prejudicar o jovem.
“O excesso de elogios ou reforços positivos pode gerar uma falsa sensação de progresso e de domínio do conteúdo”, explica Magalhães, da Plataforma AZ.
ChatGPT é excessivamente compreensivo e, em alguns momentos, leva o aluno à falsa impressão de domínio do conteúdo
g1
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