
Defesas de réus na ação da trama golpista entregam ao STF alegações finais
O Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu na noite desta quarta-feira (13) as alegações finais das defesas de Jair Bolsonaro e de mais seis réus acusados de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito e organização criminosa armada.
Do grupo de réus, Alexandre Ramagem é o único que não responderá pelos crimes de dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado, porque ele assumiu o mandato de deputado federal antes do 8 de janeiro de 2023.
As penas máximas para os crimes somam até 43 anos. Todos alegaram inocência.
Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), Jair Bolsonaro é o líder da organização criminosa, principal articulador e maior beneficiário do plano de ruptura do Estado democrático de direito para permanecer no poder.
O que diz a defesa de Jair Bolsonaro
No documento entregue ao Supremo na quarta-feira, a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro chamou a acusação da PGR de “absurda e alternativa”, afirmou que ela busca a condenação do ex-presidente sem provas mínimas e chamou a atuação da Polícia Federal de parcial.
“A acusação alternativa tem um propósito específico: conseguir a condenação, apesar das provas. Misturam-se os eventos, presume-se a responsabilidade do ex-presidente da República e consagra-se a narrativa de que ele é o responsável pelo ato final de 08 de janeiro”.
A defesa alega a falta de provas que liguem Bolsonaro aos militares das Forças Especiais e ao plano de assassinato do presidente Lula, do vice Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes.
Os advogados de Jair Bolsonaro afirmam:
“A narrativa da acusação encontra obstáculo intransponível na realidade: a transição do governo com a participação do ex-presidente também foi fato amplamente provado nos autos.”
Segundo a defesa, o ex-presidente era pressionado por descontentes com a derrota dele, mas, nas palavras dos advogados, apesar disso determinou a sucessão:
“Superando sua decepção com sua derrota, superando sua situação de saúde e apesar dos discursos dos descontentes que tentavam lhe pressionar, o ex-presidente de pronto determinou a sucessão, dando início ao governo de transição”.
Os advogados do ex-presidente apresentaram a visão da defesa sobre os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
“Quando Bolsonaro deixou o país, os acampamentos já estavam desmobilizados. E antes de deixar o país, o ex-presidente também havia garantido a transição do governo de forma não só tranquila, mas também eficaz. A ausência de nexo causal entre as suas efetivas ações de Bolsonaro – sintomaticamente esquecidas na narrativa acusatória – e os atos de 8 de janeiro tornaram a condenação por aqueles crimes de dano e contra as instituições ainda mais impossível”.
Os advogados disseram que não há no processo qualquer documento que aborde a prisão do ministro Alexandre de Moraes, como apresentado pela PF e pela PGR. E que não ficou comprovado que Bolsonaro tenha alterado a minuta do golpe.
“Não existe texto, decreto ou minuta prevendo a prisão de qualquer autoridade. Não existe decreto assinado. Não existe pedido de movimentar as tropas nem pedido a quem possa assim fazer. Não existe prova do golpe imaginado pela acusação.”
A defesa negou ainda que Bolsonaro tenha apresentado qualquer documento golpista numa reunião com comandantes das Forças Armadas. Afirmou que as tratativas com os chefes militares eram para evitar o caos social e não havia nenhum intuito golpista, e que as críticas ao sistema eleitoral eram apenas manifestação de opinião política.
Os advogados também criticaram a delação do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, e afirmaram que ela não pode ser mantida diante de uma série de problemas: por ter quebrado o acordo pactuado, omitido informações e mentido.
Por fim, a defesa alegou que Bolsonaro é inocente e pediu a absolvição por ausência de provas.
O que diz a defesa de Braga Netto
A defesa do general Braga Netto questionou a imparcialidade da relatoria do ministro Alexandre de Moraes nas alegações finais.
“Sua suspeição decorre do fato de a denúncia apontá-lo como a pessoa que seria vitimada pelos denunciados, sendo natural e evidente a contaminação subjetiva do julgador”.
A defesa alega haver ilegalidades nas provas apresentadas contra Braga Netto.
“A acusação contra ele praticamente se resume à ilícita delação de Mauro Cid e a prints adulterados de WhatsApp. A publicidade dos atos processuais foi violada. A acareação entre o Gen. Braga Netto e Mauro Cid foi ilegalmente realizada a portas fechadas”.
Os advogados disseram que Cid sofreu pressão para envolver o general na trama golpista. Rebateram a acusação de que Braga Netto entregou dinheiro em espécie a Mauro Cid para financiar as ações golpistas.
E também negaram a acusação de que o general tenha se reunido em casa para tratar do Plano Punhal Verde Amarelo.
“O tal documento sequer pode ser chamado de ‘plano’, pois não define nenhuma espécie de objetivo concreto e sequer define uma ação específica”, afirmaram.
A defesa declarou que Braga Netto é inocente e pediu a absolvição.
O que diz a defesa de Paulo Sérgio
O advogado do ex-ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, negou a acusação de que ele tenha atrasado a entrega do relatório das Forças Armadas sobre as urnas eletrônicas no primeiro turno das eleições. Segundo a Procuradoria-Geral da República, a divulgação do relatório das Forças Armadas sobre as urnas eletrônicas estava prevista para logo após o primeiro turno das eleições, realizado em 2 de outubro de 2022. No entanto, o documento só foi entregue em 9 de novembro. Apesar disso, a defesa alega que não houve atraso, pois a data limite para a entrega seria apenas em 5 de fevereiro de 2023.
“Diante do exposto, é uma patente inverdade e um manifesto absurdo afirmar que o Relatório das Forças Armadas já estava pronto antes do segundo turno das eleições e teria sido postergado, por motivos políticos.”
A defesa de Paulo Sérgio negou ainda a acusação da PGR de que ele buscou apoio das Forças Armadas para medidas autoritárias que seriam decretadas por Jair Bolsonaro. Segundo a defesa, o ex-ministro tentou, ao lado dos comandantes das Forças Armadas, demover o então presidente de cometer um ato radical.
“Por temer que grupos radicais levassem o Presidente a assinar uma ‘doideira’ e que alguma liderança militar ‘levantasse o braço’ e rompesse, o que poderia acarretar uma fissura nas Forças Armadas, sendo manifestamente contrário a qualquer medida de exceção (atuando, inclusive, para demover o Presidente da adoção de qualquer medida nesse sentido) foi que o General Paulo Sérgio, como Ministro da Defesa preocupado com a situação, convocou uma reunião para o dia 14/12/2022”.
O advogado disse ainda que o ex-ministro “chegou a entregar ao Presidente uma proposta de discurso de pronunciamento à nação reconhecendo o resultado das eleições.”
O que diz a defesa de O que diz a defesa de Almier Ganier
Os advogados do ex-comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, rebateram as acusações da p-g-r de que o ex-comandante da marinha colocou as tropas à disposição do então presidente Jair Bolsonaro para dar um golpe. Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), a ação foi durante uma reunião com Jair Bolsonaro, com o então ministro da defesa, Paulo Sergio Nogueira e com o então comandante do Exército Freire Gomes.
Ainda segundo a PGR, Bolsonaro discutiu nessa reunião uma minuta golpista. A acusação citou os depoimentos do próprio Freire Gomes e do então comandante da Aeronáutica Baptista Junior.
Nas alegações finais, a defesa afirmou que em nenhum momento Garnier colocou as tropas à disposição do então presidente Jair Bolsonaro. E alegou haver contradição nos depoimentos dos comandantes militares.
“Perceba-se que apenas Baptista Júnior, ex-comandante da Aeronáutica, afirma que Garnier teria colocado tropas a disposição. Freire Gomes, ex-comandante do Exército, que estava presente nas reuniões, afirmou apenas que ele teria se colocado ‘com o Presidente’, porém no sentido de respeito hierárquico”.
A defesa afirma:
“Almir Garnier participou de reuniões em que determinados assuntos foram debatidos. Contudo, nenhum ato executório foi praticado, pois, apesar dos debates, o então Presidente da República não determinou a prática de qualquer ato”
A defesa de Ganier conclui:
“O Réu não praticou qualquer ação que configure delito, razão pela qual o seu comportamento não possui aptidão para configurar adesão à suposta organização criminosa.”
O que diz a defesa de Augusto Heleno
A defesa do general da reserva Augusto Heleno disse que ele não agiu a favor de uma ruptura institucional e negou que o ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional soubesse da existência de um plano de golpe e da criação de um gabinete de crise que seria comandado pelo próprio Heleno e por Braga Netto. Essas acusações da PGR se basearam em documentos e anotações apreendidos com militares presos na Operação Contragolpe, em novembro do ano passado.
Os advogados disseram:
“Não há respaldo probatório para afirmar que Heleno tinha ciência de ter sido ‘contemplado’ com o cargo de Chefe de um imaginário Gabinete de Crise, coordenado pelo general Braga Netto, para dar suporte ao Presidente da República após um suposto golpe de estado. O general Heleno não presenciou qualquer tipo de discussão sobre esse assunto e, muito menos, conhecia os atos preparatórios de monitoramento de autoridades e a data da suposta ruptura institucional.”
A defesa disse ainda que a aproximação de Bolsonaro dos partidos do Centrão, no segundo ano do governo, acabou diminuindo a influência de Heleno e reduzindo sua participação na tomada de decisões e que os fatos atribuídos ao general Heleno mostram que ele teve participação “meramente acessória e periférica em relação ao núcleo organizacional” denunciado pela PGR.
O que diz a defesa de Anderson Torres
A defesa de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal, afirmou que a denúncia não conseguiu comprovar que ele foi o autor da chamada “minuta do golpe”. Segundo os advogados, o documento apreendido na casa dele é diferente do apresentado por Bolsonaro aos então comandantes das Forças Armadas em dezembro de 2022.
Os advogados afirmam:
“Nenhuma minuta foi debatida com Anderson Torres, afastando qualquer alegação de que ele tenha participado de discussões ou assessoramento jurídico a respeito desses textos. A existência de uma minuta apócrifa na residência de Torres ou mesmo o assessoramento jurídico ao ex-presidente são irrelevantes penais.”
Os advogados negaram denúncia da PGR de que Anderson Torres tenha disseminado informações falsas sobre o sistema eleitoral em lives e reuniões ministeriais. Sobre a interceptação de veículos no segundo turno da eleição em áreas em que Lula havia obtido votação grande no primeiro turno. Os advogados afirmam:
“Não há um único elemento de prova idôneo que comprove que Anderson Torres tenha arquitetado, ordenado ou mesmo incentivado qualquer atuação da PRF voltada a comprometer a lisura do segundo turno. A prova testemunhal — composta por declarações uníssonas de autoridades de alto escalão da Polícia Federal, da própria PRF e de servidores do Ministério da Justiça — foi categórica em afastar qualquer conduta de cunho político-eleitoral ou direcionamento ilícito.”
Por fim, os advogados alegaram que Anderson Torres não tem foro privilegiado e que a ação deve ser julgada na primeira instância da Justiça.
O que diz a defesa de Alexandre Ramagem
A defesa de Alexandre Ramagem negou a acusação da PGR de que o então diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) tenha Jair Bolsonaro nos ataques ao sistema eleitoral.
Os advogados afirmam:
“O Ministério Público ignorou os elementos de prova apresentados em defesa prévia, que demonstraram que Ramagem sempre se posicionou publicamente pelo incremento da segurança do sistema eletrônico de votação.”
A defesa também negou o uso indevido da Abin para perseguição de adversários políticos com o uso de um software espião. Os advogados alegaram que o programa Fist Mile foi adquirido antes da gestão de Ramagem – e que ele “atuou de forma concreta para aferir a regularidade da utilização da ferramenta no âmbito da Abin”.
Segundo a defesa, Ramagem jamais integrou qualquer organização criminosa.
“A narrativa apresentada na denúncia demonstra claramente uma radicalização de falas e atos a partir do ano de 2022, momento em que Alexandre Ramagem não mais integrava o Governo Bolsonaro”.
Ao lembrar que Ramagem foi eleito deputado federal, afirmou:
“Fere a lógica e a razoabilidade a tentativa de lhe imputar qualquer responsabilidade por tão grave intento, que, segundo o Ministério Público, seria o de abolir as estruturas democráticas, impedindo o funcionamento de um Poder – o Legislativo – para o qual acabara de ser eleito, pelo voto popular”.
A defesa de Mauro Cid já havia encaminhado as alegações anteriormente por ele ser delator. Com todas as alegações, relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes, pediu ao presidente da Primeira Turma, ministro Cristiano Zanin, que marque uma data para o julgamento dos réus do núcleo crucial.
Agora, os ministros vão analisar todo o processo e preparar os votos sobre cada um dos acusados.
Defesas de réus na ação da trama golpista entregam ao STF alegações finais
Reprodução/TV Globo